Page 66 - (Re)bolar a História
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Dona Maria Esther 


                       Oi, meu povo! ! Meu nome é Maria Esther, e hoje ”vô’’ contar um pouco da
               minha história pra vocês.
                       Eu   nasci no dia 2 de maio de 1924 em Pirapora do Bom Jesus, “ô cidade
               boa”.  Meu  sonho  era  entrar  no  mundo  do  samba,  mas  tinha  um  problema
               pequenininho, meu pai não gostava da ideia e me batia quando eu tentava participar
               das festividades. “Memo’’ assim, eu nunca desisti da minha paixão, mesmo sofrendo
               e  toda  com  dor,  corria  atrás  do  samba,  porque  ele  é que me deixa “cheinha” de
               alegria. Eu pulava a janela pra ir às apresentações de samba. “Ai ai ai”, apanhava
               muito quando voltava para casa. Meu pai me batia sem dó.
                       Hoje, adulta, lembro daquele tempo e penso: “ainda bem que consegui sair
               de  casa e buscar meus sonhos”. Por falar nisso, vou falar “pro cêis” sobre minha
               amiga,  de  São  Paulo,  que  muito  me  ajudou  a  dançar.  Ela  se  chama  Madrinha
               Eunice, sendo conhecida por ser uma grande sambista. Por “sermo” muito ligadas,
               quando tenho tempo, vou de vez em quando até São Paulo para visitá-la.
                         Conheci os ex-escravizados, como no caso dos pais da minha amiga. Fui a
               única  mulher,  sem  ser  da  raça  negra,  aceita  nas  rodas  de  samba,  que  não
               permitiam a entrada de mulheres e de pessoas que não eram de famílias negras.
               Mas acabei, mesmo assim, sendo aceita. Sou descendente de indígena. E também
               já sofri muitos preconceitos com isso e por ser mulher.
                         Tornei-me  uma  das  maiores figuras do samba paulista, mas nem sou tão
               conhecida no nosso país. Auxiliei a montar o primeiro grupo de samba de bumbo
               de  minha  maravilhosa  cidade,  isso  aconteceu  nos  anos  quarenta  do  século  XX,
               bons tempos.
                       Agora,  eu  vou  contar  um  pouco  sobre  a  condição  das mulheres da minha
               época,  assim  “ocês”  vão  saber  mais sobre tudo que passei. A vida delas era um
               pouco  injustiçada,  sabe?  As  moças  tinham  menos  direitos  que  os  homens.  Não
               tinham permissão para votar. Não podiam pedir a guarda dos filhos, sem direito à
               herança!  Quanta  coisa  ruim!  Que  triste.  Também  tinham  que  pedir,  aos  maridos,
               uma  autorização  para  realizar  atividades  profissionais.  Elas  deviam  fazer exercer
               papel  doméstico, como limpar a casa e cozinhar, entre outras coisas. Não tinham
               muita participação na política, normalmente elas só ficavam em casa.
                        E ainda tem mais!! As mulheres não eram as únicas que sofriam, os meus
               amigos negros também! E adivinha quem os “ajudô” na época? … Lógico que foi o
               samba! Durante a escravidão, por causa da sua origem, influência e tudo mais, ele
               virou  tipo  um  escudo  bem  grandão.  Então,  lá  no  meio  dos  batuques,  os
               “escravizado” tinham como se protegerem. E a liberdade com ele, por isso foi tão
               importante. Nos versos das canções, podiam colocar suas ideias e fugir da tristeza
               de ser escravos.
                       Ainda  sobre  mulheres  e  negros, vocês não vão acreditar quem eu conheci
               em     Campinas!!     Uma      “muié”    chamada  Aretha  Duarte.  Gente!  fiquei




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