Page 48 - (Re)bolar a História
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Sou Maria Esther

                       Eu sou Maria Esther e nasci em Pirapora do Bom Jesus em dois de maio de
               1924.
                       Sou uma mulher de ascendência indígena e consegui conquistar com muita
               coragem e determinação um espaço importante na cultura do samba.
                       Meu sonho, desde pequena, sempre foi dançar, mas meu pai, Geraldo, nunca
               permitiu. Ele me proibia de ir à festas. Quando eu ia escondida a esses eventos, ele
               descobria e me batia tanto, que eu não conseguia nem me sentar direito. Até hoje,
               lembro da raiva dele e de como sofri com essa repressão.
                       Quando eu tinha 18 anos, fui embora de casa e comecei a dançar. Sofri com
               o  machismo  e  com  a  sociedade  patriarcal,  na  qual  os  homens  são  vistos  como
               superiores às mulheres. Muitas pessoas achavam que eu não tinha potencial para
               dançar, mas eu ignorei tudo.
                       Matriculei-me  em  uma  escola  de  samba  e comecei a participar de desfiles
               durante as festividades de carnaval. Praticamente, dediquei a minha vida inteira ao
               samba de bumbo.
                       A única pessoa que me apoiava era a Madrinha Eunice, que era uma mulher
               muito  corajosa  e  com  espírito  independente.  Sofreu  por causa do preconceito às
               mulheres e do racismo.
                       Ela é pouco conhecida, e gosto de destacar que ela criou a primeira escola
               de samba em São Paulo, a Lavapés, símbolo do carnaval do samba paulista.
                       Nós duas defendemos a cultura do samba, pois ela é a nossa vida. Sinto que,
               com  respeito  e  dedicação,  tivemos  grande  importância  e  influência  no estado de
               São  Paulo.  Acredito  na  força que isso reflete na formação de nossa identidade e
               para todos.
                       Amo  a  minha  cidade  de Pirapora do Bom Jesus. Em meus passeios pelas
               suas  ruas,  consigo  me  sentir viva! Eu volto no tempo, relembrando os momentos
               que eu dancei nos desfiles. Meu coração bate no ritmo dos tambores, sinto o cheiro
               da poesia que é o samba, aquele que agrega todos, é raiz, corre na minha veia e é
               paixão que me incendeia.
                       Quando meus pais faleceram, a nossa casa em Pirapora transformou-se na
               Casa do Samba, um espaço cultural e turístico importante para a nossa história, que
               celebra  as  tradições  afro-brasileiras.  Em  nossa  casa,  reunimos  moradores  para
               celebrar a cultura do samba.
                       Lá,  eu  contava  sobre  mim  e,  no  final  das  visitas,  sempre  fazíamos  uma
               apresentação, para os turistas se apaixonarem pelo samba de bumbo, assim como
               eu e a tia Eunice.
                       Quando não havia turistas em casa, eu me apresentava, com minha equipe,
               nas  ruas  e  praças  de  Pirapora  do  Bom  Jesus.  Era  tão  bom  ouvir  as  pessoas
               dançando e cantando, que eu me sentia muito bem e voltava a ser uma menina. Eu
               podia sentir o amor nos corações das pessoas que estavam lá presentes.
                       Eram momentos inesquecíveis!





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