Page 96 - Fios do tempo
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Paraty, 5 de setembro de 2025.

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                        Meu nome é Beatriz Okoro e tenho dezesseis anos. Venho do futuro, do século
               XXI.  Moro  em  um  lugar  chamado Quilombo do Campinho da Independência, que
               fica no litoral do município de Paraty, no estado do Rio de Janeiro. Moro em uma
               casa  simples feita com tijolinhos e paredes pintadas de amarelo. Vivo com minha
               mãe,  que  tem  quarenta  e  seis  anos,  meu  pai,  de  quarenta  e  cinco  anos, e meu
               irmão, que tem vinte e dois anos e está desempregado.
                       Tudo começou  quando briguei com minha mãe, pois ela não queria deixar eu
               ir  à  festa  de  uma  amiga  para  ficar  estudando,  porque  terei  prova  na  semana
               seguinte da festa. Por conta disso, fui à floresta perto do quilombo para ler um livro,
               pois  isso  me  acalma  quando  fico  brava  e  chateada.  De  repente,  eu  comecei  a
               escutar um barulho vindo das moitas que ficavam abaixo da árvore mãe da floresta.
               Quando eu cheguei mais perto, vi que era uma linda flor azul turquesa, que estava
               tremendo. Foi quando eu senti uma sensação estranha e desmaiei.
                       Quando  eu  acordei,  a  floresta  estava,  de  certa  forma,  diferente  e,  então,
               decidi  voltar  para  casa.  Quando  saí  da  floresta,  vi  apenas  algumas  pessoas
               trabalhando debaixo de um sol escaldante, e outras berrando com as que estavam
               trabalhando. De repente, vi uma moça que parecia muito comigo, que era você, e
               decidi lhe seguir até a sua casa. Ao chegar lá, vi seu dono chamar-lhe de Okoro, o
               meu sobrenome. Foi quando escutei o mesmo som que eu havia escutado antes de
               ver a flor e, de repente, acordei na floresta no mesmo lugar de antes.
                       No dia seguinte, voltei à floresta disposta a descobrir mais sobre o que havia
               acontecido  no  dia anterior. Quando vi a flor, percebi que ela estava com algumas
               pétalas  caídas,  mas  não  liguei  muito  para  isso.  Novamente  escutei  o  barulho  e
               desmaiei. Acordei novamente na floresta e percebi que estava novamente no tempo
               passado. Fui imediatamente à sua casa. Ao chegar lá, vi você e mais doze homens
               e mulheres negras trabalhando, enquanto eram castigados pelos seus senhores. Eu
               passei o dia observando você e seus colegas fazendo tarefas na horta e na casa de
               seu dono, descobri que ele se chama João Ferreira. Matilde Silva é a esposa dele.
               O casal tem dois filhos: Afonso Ferreira e Tomás Ferreira.
                       No final da tarde, escutei novamente o barulho da flor e acordei aos pés da
               árvore com minha mãe me chamando de fora da floresta. Voltei para casa e passei
               a  noite  toda  pesquisando  notícias  de  jornais  para  poder  lhe  contar,  nessa  carta,
               sobre como a população negra está atualmente.
                       Hoje, o racismo, que é o modo de tratar mal alguém por conta da cor ou da
               raça, é um vestígio da escravidão e se mantém enraizado em nossa sociedade. Por
               exemplo,  temos  os  estereótipos,  que são palavras e frases que servem para nos
               ofender  e,  fazerem  as  pessoas  terem  uma  visão  negativa  da  população  negra.





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