Page 46 - Fios do tempo
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Paraty, 6 de agosto de 2025.

                                                                                Prezada Adanna Amani,

                       Eu me chamo Zuri Amara Nala, tenho 21 anos e moro em uma casa de tijolos
               toda bagunçada. Tenho uma vida difícil, porém sou feliz com o que tenho. Trabalho
               em  um  restaurante  localizado  no  Quilombo  do  Campinho,  em  Paraty,  no  Rio  de
               Janeiro. Nossa comunidade não existia em seu tempo. Moro com meus pais, que
               são Imani Amara e Jabari Nala. Eu não tenho tantos estudos. Faço tudo em minha
               casa para cuidar dos meus pais. Sou bem magra e não tão forte, mas sou rápida
               para atender os clientes do restaurante.
                       Mas o que realmente preciso explicar foi como vim parar aqui em Paraty, no
               século XVIII, e conheci você. Eu estava em uma trilha no meio da mata, andando
               até o restaurante, quando, de repente, senti que tudo estava girando ao meu redor e
               eu  desmaiei.  Quando  me  levantei,  a  paisagem  estava  embaralhada,  mas  as
               pessoas passavam por mim como se não estivessem me vendo. Olhei ao redor e vi
               uma  moça  que  me  chamou  atenção:  era  você,  Adanna.  Acompanhei  você,  que
               andava  até  uma  das  igrejas.  Notei  que  você  era  forçada  brutalmente  a  adotar o
               catolicismo.
                       Ouvi  você  comentando  com  uma  pessoa,  também  escravizada,  que  seus
               avós  foram  trazidos  para  a  colônia  portuguesa  por  Francisco  Rodrigues,  José
               Gonçalves  e  Manuel  Fernandes  e,  infelizmente,  não  sobreviveram.  Que  pena,
               amiga.
                       Você era uma moça baixa, bem magra, tinha a pele bem escura e estava à
               beira do colapso mental por causa da escravidão e da situação que vivia. Senzala
               era  o  lugar  onde  você  ficava  enquanto  não  estava  trabalhando.  Todos  estavam
               amontoados nela, passando fome. Quando recebiam comida, era muito pouca e, às
               vezes,  não  tinham  a  oportunidade  de  se  alimentar.  Sinto  muito  por  você  ter que
               passar por tudo isso.

                                          Enrico Lorenzi Berni, Guilherme Palanch de Lima, Leonardo
                                                Kammerer Bocayuva e Rodrigo Bevilacqua Stebulaitis

                                                             Colaboração de Manuela Rodrigues Mota













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